quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O Incal - Moebius e Jodorowsky:



Tudo o que eu sabia sobre Incal (Devir Editora, 2012) antes de lê-lo é que era um dos grandes clássicos da nona arte. Mal tinha ideia de que durante a leitura eu seria jogado em um mundo ciberpunk e psicodélico enquanto acompanhava as rocambolescas e oníricas desventuras do detetive John Difool depois que este recebe o misterioso (e poderoso) artefato Incal das mãos de um alienígena moribundo e se vê em meio à revoluções e conspirações pelo controle da galáxia do império humano. Meu interesse pela obra veio, à princípio,  unicamente por conta de seu desenhista, Moebius, pseudônimo do francês Jean Giraud, falecido ano passado. 
Jean começou sua carreira em HQs de faroeste, mas ficou mais conhecido pela criação da revista Metal Hurland (ou Heavy Metal, em sua versão norte-americana) e por seus trabalhos em quadrinhos de sci-fi e fantasia. Moebius também é largamente conhecido por ter trabalhado como designer de produção em filmes como Alien: O Oitavo Passageiro, Tron, Mestres do Universo,Willow, O Segredo do Abismo e O Quinto Elemento, entre outros.
O roteiro da HQ é de Alejandro Jodorowsky, chileno nascido na cidade de Iquique, dono de inúmeros talentos. Renomado escritor, poeta, psicólogo e cineasta, foi justamente em uma produção de cinema que Alejandro começou a trabalhar com Jean Giraud. Ambos deram início a produção de uma adaptação do livro Duna, de Frank Herbert, uma década antes daquela realizada por David Lynch. Dois anos de trabalho depois e o projeto colapsou. Entretanto, foi o contato de ambos artistas em meio à ficção científica que deu o ponta pé inicial em Incal, que acabou sendo escrito durante toda a década de 1980.
Longe do estilo poético de Neil Gaiman ou de Alan Moore ou mesmo das aventuras noir engendradas por Mike Mignola, o Incal parece uma imersão completa dentro de um brainstorm regado a LSD feito por Jodorowsky e Moebius. Cada página trás, sem nenhum pudor, novas situações, personagens, criaturas, mundos e desafios. Desafios estes que são superados rapidamente, como se os autores pensassem "Porquê perder tempo com isso? Ainda temos tanto a mostrar!". Em Incal o importante é a viagem, não o destino.
Moebius e Jodorowsky: Produtores de LSD em forma de quadrinhos
E assim se descortinam inúmeros personagens em que, mais do que suas personalidades, são seus interessantes nomes (Imperadortriz, Necrodroid, Meta-barão, Tecnopapa...) e suas criativas figuras que chamam a atenção e se tornam marcantes. Não só personagens humanóides, mas planetas, naves, cidades, animais e tudo que saiu do maravilhoso e detalhista traço de Moebius e da mente influenciada por Tarô de Jodorowsky (o personagem principal, por exemplo, é baseado na carta do Louco) é fascinante. É impossível virar a página antes de se admirar por uns bons minutos cada pequeno detalhe que ali se encontra. 
Assim, Jodorowsky e Moebius levam seus leitores por mais de 300 páginas que exploram de uma decadente capital à outra galáxia, passando por um planeta aquoso, pelo interior de um mundo e por bizarras viagens metafísicas.
Não é dificil se perder na trama. Conspirações, revoluções, guerras entre galáxias... parece acontecer de tudo durante a história. Em certo momento eu já começava a temer por uma "sindrome de Lost" na HQ. Ou seja, pensei que os criadores do quadrinho, assim como aqueles do famoso seriado de TV, de tantos mistérios e reviravoltas iam acabar se perdendo e trazendo um final qualquer para sua história. Ledo (e feliz) engano. Em Incal acontece justamente o contrário, conforme avançamos no encadernado as pontas que pareciam soltas e sem propósito começam a se juntar, até que chegamos à um final excepcional.
Mais do que uma história em quadrinhos, Incal é um grande exercício de imaginação e criatividade de duas grandes mentes. Imperdível.

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