quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Suécia 1 X 1 EUA

Existem mais preconceitos entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia. Acredito que tudo que existe no mundo tem alguém pra odiar e ter preconceito. Vamos pensar em cinema agora. Tem gente que tem preconceito de filme europeu, tudo muito chato, ou de cinema americano, blockbusters sem cérebro, ou de filmes brasileiros, ou de filmes de aventura, ou de filmes de arte, ou de animações, ou de chanchada... e por aí vai. É aí que chego nessa interessante disputa entre Suécia e EUA, com suas versões de Os Homens Que Não Amavam As Mulheres e Deixa Ela Entrar (no original em sueco, ou Deixe-me Entrar, na versão americana).

Dentre os filmes lançados nos cinemas  brasileiros este ano, o que mais gostei (ou pelo menos, um dos) foi o Homens..., de David Fincher. Fincher, alias, é um dos meus diretores preferidos. O cara é responsável por filmaços como SevenClube da Luta Zodíaco. Mesmo filmes "menores" dele, como Alien 3 ou O Curioso Caso de Benjamin Button têm diversas qualidades e não podem, de maneira nenhuma, serem considerados filmes ruins.

Investigações com sotaque sueco...
(Fonte: http://ci.i.uol.com.br)
Sendo assim, fui prontamente atraído a conferir o projeto. As primeiras imagens da atriz Rooney Mara caracterizada como a personagem Lisbeth Salander só aguçaram minha curiosidade e, ao ouvir a corajosa e impressionante releitura de Immigrant Song, do Led Zeppelin, pela dupla Trent Reznor e Karen O (Yeah Yeah Yeahs), a qual entraria na trilha sonora do filme, eu já tinha decidido que não poderia perder a oportunidade de ver o filme no cinema.

E ele não decepcionou nem um pouco. Gostei bastante do roteiro, mas foi a direção segura de Fincher, somada à belíssima fotografia, trilha sonora espertíssima e as ótimas atuações, em especial à brilhante atuação de Rooney Mara, que me convenceram. O filme me transmitiu uma sensação de incômodo e de opressão que me jogava dentro da tela, como se eu estivesse lado a lado com todos aqueles complexos personagens. Não li o livro e não sei dizer se o filme é uma transcrição perfeita da história ou se foi bastante adaptado, fato é que os Homens... funcionou otimamente na telona. Um thriller de classe.

... e com sotaque norte-americano.
(Fonte: http://3.bp.blogspot.com)
Gostei tanto do filme que resolvi baixar a trilogia Millenium sueca. Que diferença! Os Homens... sueco tem uma cara de telefilme safado. O ritmo do filme é meio truncado, lento. O enredo possui arestas demais, que foram muito mais bem resolvidas na versão ianque. Por fim, a Lisbeth da atriz Naomi Rampace é bem executada, mas empalidece perto da visceral interpretação de Rooney Mara. 

Com Deixa Ela Entrar percorri o caminho contrário e assisti ao sueco antes. Vi excelentes críticas e comentários sobre o filme pela internet afora e me interessei em assistir. E que filme! Os pobres dos vampiros precisavam de um filme assim. Ele foge de tudo que tem sido feito no gênero ultimamente. Não é uma história pop e açucarada como os Crepúsculos, e nem aventura como os Underworld. Tão pouco tem a ver com clássicos como Drácula eEntrevista Com O Vampiro.

Neste filme a história principal é do menino Oskar. Filho único de pais separados, tímido e retraido, Oskar é alvo de bullying na escola. Sua rotina muda com a chegada da nova vizinha, a vampira Eli, e seu "pai". O filme é mais sobre a vida do menino, sofrendo na escola e em casa, do que sobre vampirismo em si. A chupadora de sangue aqui entra como uma alegoria à violência e à solidão, a ser um pária da sociedade, às dificuldades da transição infância-adolescência.

Terror de um lado do Atlântico...
(Fonte: http://1.bp.blogspot.com)
A película tem uma aura cult e delicada, fazendo com que o espectador possa ir pensando, se deliciando com os pormenores das cenas e tirando suas próprias conclusões.

Curti tanto o filme, que assim que saiu a versão americana, eu quis assistir (e, mais recentemente, ao saber do lançamento do livro que deu origem aos longas, corri atrás para comprar meu exemplar).

Verdade seja dita, a versão americana não é ruim. Aliás, os atores (poxa, tem a Hit-Girl como vampira!) e efeitos são melhores, e a história é praticamente a mesma. 

... e do outro.
(Fonte: http://blogs.independent.co.uk)
Entretanto, depois de ver o filme me perguntei qual foi a intenção da refilmagem. A impressão que tive é de que o projeto foi conduzido por apenas um motivo: preguiça do público norte-americano. Preguiça de ler as legendas e principalmente preguiça mental de notar as sutilezas do filme original, que aqui foram todas escancaradas de forma didática, fazendo com que a história perdesse bastante da força que tinha.

Pra mim o mais interessante de ter visto esses quatro filmes foi perceber o quanto a mão do diretor pesa em um filme. De histórias iguais podem sair filmes muito diferentes, dependendo do estilo e competência dos envolvidos no projeto. 

E mais do que isso, vendo esses filmes ficou ainda mais reforçada na minha cabeça a ideia de que qualquer tipo de preconceito é imbecil, conheça/assista/leia/whatever antes de julgar alguma coisa.

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